11 de março de 2012

Janelas se escondem atrás da 8ª janela


O mercado de computadores não é mais o mesmo depois do surgimento do iPhone e do iPad. A Apple iniciou a tal da "era pós-PC" com seu smartphone e seu tablet enquanto a Intel, a Microsoft e amigos insistiam na idéia do netbook. Para correr atrás do prejuízo a Microsoft investe pesado e coloca a sua marca mais valiosa em risco, o Windows 8 é a aposta para tentar tirar um pouco de atenção da Apple e ao menos conseguir um segundo lugar no mercado de tablets diante do fracasso do Android neste segmento.

No último dia 29 de fevereiro a Microsoft lançou em Barcelona, durante a Mobile World Congress, o Consumer Preview de seu novo sistema operacional. Para adentrar a nova onda do touch screen o Windows 8 traz a interface Metro introduzida pelo Windows Phone 7 e que também se tornou conhecida na última atualização do Xbox 360. A nova interface traz um visual repleto de pequenos azulejos coloridos que valorizam a iconografia. Alguns desses azulejos são dinâmicos e mostram informações como novos e-mails, a previsão do tempo e compromissos da agenda. É algo que se esforça em se diferenciar do sistema iOS da Apple, cujos ícones são estáticos e a interface tenta imitar elementos do mundo real, como uma agenda com capa de couro e um bloco de notas Moleskine.

Aplicativo nativo de calendário do Windows 8 (esquerda) e do iPad (direita), ambos suportam sincronização com o Google Agenda, embora falte algumas opções no Windows (versão ainda em testes, e estranhamente em alemão)
A interface Metro é uma grande quebra de paradigma para o antigo usuário de Windows, não comecei este texto falando dos tais azulejos a toa. O menu Iniciar como você conhece não existe mais, ele se transformou na tela que você acabou de ver na primeira imagem acima. É a tela que aparece logo após o seu login, o que dá ao sistema operacional um aspecto que lembra muito mais um tablet propriamente dito do que o seu "antigo" Windows 7. Outros fatores que contribuem para a "tabletização" do sistema é o fato dos aplicativos rodarem em tela cheia, sem aquela barra de título no topo com os botões 'minimizar – ampliar/reduzir – fechar' do lado direito, e agora a Microsoft parece preferir que você não feche os programas, mas sim os coloque de lado (literalmente) em uma lista de programas usados recentemente. No Metro a Microsoft simplesmente elimina o conceito de janelas que deu nome ao sistema operacional.

Passar o mouse sobre o canto esquerdo superior da tela traz lista de aplicativos recentes, lembrando sistemas portáteis como iOS e Android.
Menu Iniciar antigo, que dá acesso a todos os aplicativos instalados, ganha repaginação e fica mais escondido. "Programas" viram "Apps" (aplicativos) 
Um dos recursos mais interessantes é poder deixar um aplicativo Metro pendurado na lateral, em tela dividida, como o e-mail
Mas não se desespere – ainda – a antiga área de trabalho (desktop) está disponível mas a Microsoft parece ter deixado ela em segundo plano para poder privilegiar a interface Metro. O acesso é feito através de um dos azulejos da "tela Iniciar", na imagem do topo do post ele é o azulejo duplo na base da primeira fileira à esquerda, exibindo o peixe estilizado do novo papel de parede padrão do Windows 8. Me parece estranho colocar o acesso à algo da dimensão da área de trabalho no meio de outros pequenos programas como Previsão do Tempo ou Paciência (Solitaire), a Microsoft parece querer que você realmente use a Metro mais do que a interface antiga.


Mais tímida, a área de trabalho ainda conserva os gadgets implementados pelo Windows Vista em 2006, um recurso que ainda não deverá ser relevante visto a oferta pobre deles. As bordas das janelas dos programas também herda aspectos do Vista, a translucidez, mas perdem as bordas arredondadas para ganharem um visual mais límpido, muito bem vindo. A diferença chocante, por conta do Metro, é a ausência do botão do "menu Iniciar". O acesso à "tela Iniciar" ainda será natural, podendo ser feito pela tecla Windows do teclado ou então naquele mesmo canto em que estava o antigo menu. Ao passar o cursor do mouse na região em que ele estava anteriormente (lado esquerdo inferior) surge um pequeno gráfico que irá te levar à tela na interface Metro (você não consegue fugir dela por muito tempo).


Outra grande mudança é que a interface Ribbon introduzida pela Microsoft no Office 2007 está agora presente em quase todos os principais programas que sustentam o Windows 8 fora do Metro, isso inclui o Windows Explorer. Quem gostava dos antigos menus que sempre tinham "Arquivo" como primeira aba terão que se despedir e abraçar o novo sistema, que eu pessoalmente acho mais agradável. Você perde um pouco de velocidade e espaço na tela, mas ganha ícones mais representativos do que só uma lista de texto.


Essa guerra entre interfaces me leva a outro ponto, os programas em si. Aqui podemos dividi-los em duas espécies diferentes: aqueles que habitam o ambiente Metro e aqueles que habitam a antiga área de trabalho. São facilmente diferenciáveis pelos azulejos na "tela Iniciar", os coloridos são os que aproveitam os recursos da nova interface Metro e são amigáveis para tablets, enquanto os outros mais genéricos precisam tirar você do ecossistema Metro para serem executados. Existem programas com versão para as duas interfaces como o caso do Internet Explorer. As duas versões não são unificadas, e funcionam sob processos independentes.

O conflito se estende a outras áreas do sistema. A barra lateral de programas recentes do Metro mostra apenas programas do Metro, tratando todo o conjunto do ambiente antigo da área de trabalho como se fosse apenas mais um aplicativo qualquer. Coisa que o atalho de teclado Windows+Tab também faz, diferente do Alt+Tab que trata todos os programas de forma mais homogênea.

Internet Explorer no Metro (esquerda) e no desktop (direita)
Submetidos a mesma situação, alternadores de programas funcionam de forma diferente
Os programas Metro serão distribuídos através da loja virtual online Windows Store, como todos outros sistemas mobiles – iOS e a App Store, Android e o Google Play (antigo Android Market). Embora ainda falte muito para o lançamento oficial já é possível encontrar alguns aplicativos familiares dos sistemas concorrentes, o de maior nome é o jogo Cut the Rope. Segue a iniciativa da Apple, que fez o mesmo ao implementar a Mac App Store no Mac OS X 10.6.6 Snow Leopard.


A parte de jogos do Metro parece estar toda associada ao nome Xbox, pegando carona no produto da Microsoft que está em seu melhor momento no mercado. Aparentemente a área deverá focar nos jogos mais simples, compartilhando jogos com os smartphones que utilizam o sistema Windows Phone 7 (que já tem a marca Xbox Live). Enquanto isso não há muitas novidades para a marca Games for Windows, que parece ter sido enterrada após ter fracasso em sua idéia de facilitar jogar no PC.


Outra parte que lembra muito o Xbox é a de venda de conteúdo multimídia. Indisponível para o Brasil, o Windows 8 deverá dar acesso ao mesmo catálogo de músicas e vídeos que o usuário de Xbox tem. Abandonando o nome e o serviço Zune, a Microsoft deverá ter um alcance muito maior para vender conteúdo multimídia. É uma corrida atrasada atrás do iTunes, mas que deve estar dando retorno em um mercado em crescimento nos EUA. Outros concorrentes incluem o Netflix, a Amazon, e o Google Play.


Nota-se que o Windows 8 é um sistema muito ligado à disponibilização de conteúdo pela internet de forma centralizada, o que me preocupa muito vendo o caso da Xbox Live brasileira. A venda de certos conteúdos esbarra em direitos comerciais (cada país pode ter uma distribuidora diferente para cada artista) e/ou questões legais (como a obrigatoriedade da classificação etária do Ministério da Justiça para poder vender jogos no Brasil). Na Xbox Live essas restrições fizeram com que o catálogo brasileiro fosse absurdamente menor que o catálogo norte-americano.


A maior parte desse texto coloca em dúvida a decisão da Microsoft em trazer a interface de seu smartphone para os computadores. A Metro é uma coisa que você vai querer usar? Eu devo admitir que o tom negativo desse texto tem muito a ver com a plataforma que utilizei para testar, um notebook convencional. A experiência talvez seja muito mais rica e fluída em um hardware com suporte a tela sensível a toque – de preferência capacitiva – no qual o Windows 8 se aproveita ao máximo de gestos como o deslize de dedo nas laterais da tela e o movimento de pinça com a capacidade de reconhecimento multi touch. Não digo que estou errado, porque o meu caso será o de muitos, provavelmente da maioria dos usuários.

A Microsoft se esforçou em tornar a Metro utilizável em ambos tipos de plataforma, tanto a toque como no uso de mouse e teclado. O problema é que a adaptação não é tão intuitiva usando o mouse quanto é com os gestos de toque. É uma curva de aprendizado lenta, porque ao menos neste Consumer Preview não existe nenhum tipo de tutorial. Alguns menus em que se acessaria puxando eles com o dedo em um dos lados da tela, no mouse você deve clicar o botão direito. Não são traduções exatas, o que pode confundir e frustrar a muitos.

Ao instalar o Consumer Preview – que é na verdade um nome bonito para versão beta – não tive problema algum com drivers, a Microsoft parece ter sofrido o suficiente com o Windows Vista e manteve a compatibilidade dos mesmos. As coisas funcionam bem, e diria que ele está bem preparado para o lançamento previsto para o segundo semestre deste ano. O meu notebook que roda o Windows 7 64 bits conseguiu funcionar aqui de forma rápida e estável, não é um sistema que faz grandes exigências de hardware. A questão aqui é otimizar, inclusive haverá uma versão nova especifica para os processadores ARM – de baixo consumo de energia, voltado para aparelhos portáteis – que infelizmente terá algumas restrições.

Mais discreto, novo sistema de notificações em forma de pop-ups no canto superior direito da tela não interrompe o seu trabalho
A grande questão que é colocada na mesa é a necessidade de unificar as interfaces. O Metro já está presente no Windows Phone 7 e no Xbox 360, e agora é a vez do Windows 8 aprender essa língua. A mesma interface já é manipulada através de tela de toque, joystick, Kinect, comando por voz e agora teclado e mouse, cada um com suas particularidades. Será possível tirar o melhor proveito de cada plataforma – smarthphone, tablet, videogame, PC – com apenas uma interface? A unificação tornará a vida do usuário mais fácil ou mais confusa? Essas são apostas que a Microsoft está pagando para ver.

Painel de Controle tem versão simplificada no Metro (esquerda) e mantém a versão completa acessível pelo Windows Explorer (direita)
Com idéias ousadas, o caminho para o sucesso ainda tem barreiras. O Windows 8 dependerá muito da venda de novas máquinas. HP, Dell, Samsung, Sony e outros parceiros devem projetar novos computadores que privilegiem o uso da tela sensível a toque, em soluções práticas e leves. Para competir com o – ainda pequeno, mas crescente – Mac é importante ter velocidade e facilidade uso. Aproveitar a evolução dos netbooks, os ultrabooks, para dar uma nova imagem ao PC que roda Windows. Se possível, evitar vender o computador cheio de porcarias (bloatwares) instaladas de fábrica. E seria bom também se a Microsoft parasse de criar inúmeras versões do sistema operacional (Home, Home Premium, Professional, Ultimate, Enterprise, Starter Edition, etc). Infelizmente há indícios de que haverá oito versões diferentes a venda no mercado.

Lenovo IdeaPad Yoga mostrado na CES 2012, laptop se dobra para se transformar em tablet
Eu não costumo receber muito bem essas mudanças que alteram algo que estou acostumado e confortável, como aconteceu com a mudança da barra de tarefas do Windows 7. Acho que ninguém gosta, até o momento que elas passam a fazer sentido e você começa a notar e valorizar as melhorias. A interface Metro talvez seja a maior mudança no sistema desde o Windows 95, e ao menos para mim não é uma mudança natural. A "era pós-PC" obrigou a Microsoft tomar uma posição, e essa grande mudança de interfaces parece ser o caminho para modernizar a plataforma. O problema é que estamos em uma fase transitória, e a alternância será confusa e muitas vezes irritante (demorei para achar, por exemplo, o botão de desligar o computador). Espero que a Microsoft faça alguns ajustes que andam faltando até o seu lançamento no segundo semestre para torna-lo mais amigável. Pequenos ajustes que podem fazer toda a diferença.


Agora só falta a sincronização dos savegames entre os aparelhos...





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